Quando a música de Caetano Veloso voltou a ver o Sol

 Quando a música de Caetano Veloso voltou a ver o Sol

Caetano Veloso – Cinema Transcendental – 1979

A discografia de Caetano Veloso entre a Tropicália e o final dos anos 1970 mostra uma linha narrativa de um artista que, interrompido por questões fora do seu controle, teve de se reconstruir e se reencontrar dentro da sua arte. O exílio, que durou de 1969 a 1972, fez com que Caetano desenvolvesse uma obra mais introspectiva, seja pelo frio londrino, destino da sua ausência em terras brasileiras, ou pela simples distância de sua terra natal, que sempre foi extremamente conectada a sua obra. Tanto a distância quanto a volta, ainda impactada pela censura, mostram um artista mais dado a experimentações, um céu nublado que cobriu o tropicalismo solar do que estava sendo construído em sua discografia.

A coisa começa a mudar um pouco em 1977, com Bicho. Se em Qualquer Coisa, de 1975, ainda aparecem algumas músicas dos Beatles no repertório como impacto direto da convivência forçada com a cultura britânica, em Bicho surge o show com a Banda Black Rio e o funk, que estourava nos Estados Unidos, com inspirações africanas adquiridas em viagem à Nigéria. Como bom tropicalista, Caetano trouxe a onda e subverteu a seu modo. Ainda tateando, Caetano lança Muito – Dentro da Estrela Azulada em 1978 – e, mesmo tateando, Caetano já consegue produzir hits como “Sampa”. Mas esses dois discos já trazem músicos de estúdio que entregam e dão um gosto do que está por vir. Vinicius Cantuária, Arnaldo Brandão, Tomás Improta, entre outros, formam a A Outra Banda da Terra, grupo que acompanhou Caetano em cinco discos entre 1978 e 1983. Em 1979, no segundo disco dessa formação já experimentada e ajeitada, chega Cinema Transcendental.

 

Aqui, Caetano volta ao Sol – e a capa, numa praia, já entrega esse retorno à luz. Caetano já afirmou que esse período, com A Outra Banda, foi o mais feliz, musicalmente falando, da sua carreira. Cinema abre o baile com “Lua de São Jorge” e tem, sim, canções mais minimalistas como “Oração Ao Tempo” e “Vampiro”, mas, mesmo nessas, a voz de Caetano soa positiva, extrovertida e pra cima. Os destaques, além dessas já citadas (e só pela interpretação, vale citar “Vampiro” de novo), tem “Menino Do Rio” (feita para Baby do Brasil, na época, Consuelo, que gravou no mesmo ano), “Beleza Pura”, “Cajuína” e “Badauê”, composição do mestre Moa do Catendê, quase uma vinheta do afoxé fundado pelo capoeirista morto pela loucura dos dias políticos atuais em 2018. Em “Beleza Pura”, Caetano manda um “moço lindo do Badauê” que, dizem, é Moa.

Não se sabe se essa volta ao Sol foi natural, uma necessidade do artista, ou se foi por algum tipo de pressão da gravadora, uma necessidade do mercado – já que os discos anteriores, experimentais até o osso, pouco venderam. Independente da causa, a consequência ficou gravada em nossos ouvidos em uma coleção de canções que pareceu interminável, mas teve seu auge em Cinema Transcendental.

Caetano Veloso – Cinema Transcendental – 1979

Ouça o disco

  1. Lua De São Jorge
  2. Oração Ao Tempo
  3. Beleza Pura
  4. Menino Do Rio
  5. Vampiro
  6. Elegia
  7. Trilhos Urbanos
  8. Louco Por Voce
  9. Cajuína
  10. Aracaju
  11. Badauê
  12. Os Meninos Dançam
  • Não Pulo Uma Faixa é um site cofundado pelo jornalista Marcos Lauro e que se dedica a falar sobre discos perfeitos, daqueles que ouvimos por inteiro. Semanalmente, ocupará esse espaço no Portal Mais Brasil com discos brasileiros que marcaram época.

 

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