@desavexe: Novos poetas brasileiros conquistam a internet
Leia e se inspire com o autor do canal que difunde poesia e arte
A poesia brasileira passa por um momento de profusão. Com a democratização dos meios, vários artistas se destacam e tem suas mensagens propagadas a lugares que nem imaginam, a perder de controle. O Mais Brasil, ao longo de seus 10 anos de existência, distribui muita poesia, reflexões, pensamentos e inspiração. Entre os canais está o @desavexe, que você já deve conhecer.
Conversamos com Matheus Vieira, autor e também ilustrador, que fala de saúde mental, da importância do autocuidado, de situações cotidianas, tudo isso de forma poética e através da arte. Quase como um remédio colocado no meio da ração. Algumas pílulas que, por mais que sejam desagradáveis, temos que tomar.
“As pessoas me encontram num lugar de fragilidade, o lugar da fragilidade do ser humano de não saber verbalizar o que sente, aí é que chegam até o @desavexe. E ter uma pessoa que fala o que você está sentindo, sem você saber o que está de fato sentindo, é muito diferente. Porque parece que você não está sentindo só, você está sentindo no coletivo”.
+BR: De onde você sente que vem a identificação com o perfil? O que leva as pessoas a compartilhar?
M.V.: As pessoas passaram a se identificar porque precisavam de alguém que verbalizasse o que elas não conseguem fazer. E não é que eu consiga fazer. Pra ser escritor passei por um processo de sentir todas as coisas. Principalmente por um processo terapêutico. A terapia me trouxe pra esse lugar de conseguir verbalizar, de falar. E principalmente conseguir falar de uma forma que consiga chegar em outras pessoas. Quando a gente trata de falar de sentimento, tratamos de uma linguagem mais comum e universal. Não adianta fazer um texto todo rebuscado, com muitos termos diferentes. Não vai chegar pra todo mundo e nem todo mundo vai ter a mesma leitura. Comecei a escrever nesse lugar de encontro, mesmo. Comecei a escrever pra mim e comigo há três anos e as pessoas começaram a se identificar a partir disso.
O @desavexe surgiu e o primeiro post a ser compartilhado na internet foi no @maisbrasil. E foi daí que deu o ponto de start pra que as pessoas começassem a me encontrar na internet. No começo eu não escrevia, eu só ilustrava. Fazia desenhos de música e arte brasileira, totalmente sem olho. E aí o Marcelo Manso me encontrou e compartilhou.
No início eu pensava que @desavexe e Matheus eram duas pessoas. Hoje eu já entendo que existem momentos diferentes, mas é a mesma pessoa. Eu acho que a arte tem esse papel de me salvar da minha vida, me tirar de sentimentos ruins e me ensinar a verbalizar.
Nem todas as coisas que posto tem a ver comigo. Às vezes é de alguém que me contou alguma coisa, alguma situação que vivi de algum jeito. Minha mãe é cheia dessas “Esse texto que você escreveu, foi sobre mim?”. E nunca é. Não é sobre pessoas, é sobre situações, que envolvem pessoas, que pessoas passam.
Vivo isso nos meus círculos “Esse texto é sobre mim?”, e eu sempre me explicando que é sobre sentimentos e o que me tocou, o que causou em mim e eu transmito para outras pessoas. E é onde essas pessoas se identificam. Para além da identificação pelo que eu escrevo, há uma questão de terapia, que através daquele texto, elas buscam e revisitam o @desavexe, para unificar esse pensamento na mente, como um mantra. “Eu leio todo dia aquele texto e eu coloco isso como uma realidade”. Mas isso não é suficiente, se a pessoa não absorve e não toma medidas, o texto em si não tem efeito.
Não tem como falar de afeto e vivências sem pessoas. Somos movidos de e por pessoas. Podemos até ficar a sós, mas pra caminhar precisamos de coletivo. No nascimento somos plural com nossa mãe, a gente cresce na nossa família que é um coletivo, a gente vai pra escola que é coletivo. A gente se movimenta a partir das pessoas, as ações que são individuais, mas só o coletivo funciona. E o afeto depende de coletividade. Ainda que você pense que viveu algo sozinho, foi movido por um sentimento que já não o deixa mais sozinho.
+BR: E partindo de você para o coletivo, o que foi que o motivou? Qual foi o primeiro impulso?
M.V.: O @desavexe surgiu num momento de pós-término de um relacionamento, eu estava na amargura de um sofrimento, naquele buraco e pensei “Meu Deus, agora vou cair de cabeça e já era”. E fui escrever. Primeiro porque precisava de expor meus sentimento, pra mim mesmo e precisava de alguma forma me conectar com isso. E pra mim foi um pouco assustador, não estava nos meus planos, não era isso que eu tinha planejado para minha carreira. Sou formado em Engenharia Civil. E pensava “Eu vou escrever na internet pra quê?”
Hoje em dia eu consigo entender o que tinha que acontecer nesse propósito. Quando a gente começa a comunicar na internet, existe um encontro com pessoas, as pessoas procuram pra conversar, pra perguntar o que eu acho. Eu não tenho que achar nada. Eu não sou psicólogo, estou escrevendo o que estou sentindo. E é só isso.
+BR: Como é a relação com os seguidores?
M.V.: As pessoas perguntam “@desavexe terminei meu namoro, o que você diz sobre isso?”. Aí eu falo: “Gente, como eu posso dar um conselho pra você só vendo a sua ótica da coisa? Não tem como”. As pessoas encontram esse lugar de conforto e diálogo e acabam pensando que sou psicólogo. O @desavexe na verdade é um espaço para refletir e inspirar. Se você vê o conteúdo e não toma uma atitude, não busca uma terapia, não pede uma ajuda, não faz nada, você desperdiça.
+BR: Nesses tempos de vídeos e de alta exposição, como você participa? Quem não reparou no seu avatar está vendo seu rosto pela primeira vez…
M.V.: É interessante ver o quanto o @desavexe cresceu nesse lugar da escrita e ao mesmo tempo o quanto esse escritor, que sou eu, é cheio de inseguranças. Aparecer pra mim é um trauma, eu tive que fazer isso porque o Instagram foi hackeado. Pra mim foi um trâmite. Eu tive que gravar uns 30 vídeos e pensei “Acho que esse é o menos pior dos 30”. Só que não basta ser escritor. Eu tenho que ser escritor, blogueiro, entender de mídias sociais, de desenho, entender de like. Infelizmente a escrita só dá dinheiro a partir do momento que eu consigo lançar um livro.
+BR: E você pensa em lançar?
M.V.: Todo processo de lançar um livro na internet é um pouco complicado. As produtoras que chegam pra propor lançamento não querem “o” @desavexe, elas querem o nome que eu já tenho na internet. Não é exatamente pelo que eu escrevo, mas pelo tamanho da marca. E perde um pouco do sentido do que quero fazer. Já estou estruturando um projeto, mas quero lançar um livro em que eu seja eu. Se eu perco a essência do que quero fazer, perde o sentido do que trouxe para as pessoas. Nesse lugar do “juntos”. Já tive algumas propostas e nenhuma deu certo por conta do propósito, da divergência de caminhos. Eu cheguei a cogitar de lançar um livro 100% sozinho, não quero depender de editora. Mas ser artista independente é muito difícil. Tem todo um processo. Não sei o que é melhor, lançar um livro ou deixar de lançar.
+BR: E como é isso?
M.V.: Além de verbalizar meu trabalho e ter rendimento do meu trabalho, eu preciso de uma editora. Além da editora, preciso ser uma pessoa que publica na internet, ter vídeo, falar na internet, porque as pessoas também cansam só de leitura. Eu preciso me adequar. É o tópico de: levar na terapia, trabalhar na terapia, aparecer pra gravar vídeo, ver se isso tá bom. Porque uma coisa é escrever, outra é aparecer pra falar. Então, tem todo um planejamento de rotina, trabalho. Eu acho que sai desse lugar de ser somente um escritor. E aí não é apenas escrever, mas viabilizar nosso trabalho lançando um livro, que é um dos únicos caminhos de um autor.
+BR: E quanto à sua arte, como é seu olhar? A começar pelo nome @desavexe, diria que é bem brasileiro?
M.V.: Quando eu entrei na ilustração, tipo o post do copo, não idealizei. Só peguei e pensei “vou desenhar um copo americano e vai ornar”. E realmente aconteceu. Foi uma coisa assustadora. Eu pensei “Gente, pelo amor de Deus! É um copo e uma frase. Não tem nada pra você olhar e falar que essa arte aqui bate bem”. Mas depois de um tempo eu consegui entender o quanto o copo americano em si é importante e significa para o brasileiro. Do café, à cerveja, à água, mais a frase, juntando tudo. Foi sem premeditar, mas aconteceu. Hoje eu tenho muita vontade de juntar as duas coisas. Mas meu público em si, está pela leitura, não mais pela ilustração. Meu desafio atual é unir as duas coisas. É muito mais fácil desenhar do que escrever. Escrever requer um trabalho maior, uma elaboração maior. O desenho flui mais.
+BR: E quais são suas principais inspirações? Que sentimento te convence até o momento do post?
M.V.: Pra conseguir escrever sobre sentimentos, tenho redes de afeto no trabalho, religião, família, amigos, de gente que encontro. Tudo isso compõe minhas inspirações, meus pensamentos e o que é lido no @desavexe. Mas para além disso também tenho várias referências, artistas que acompanho, como Iandê Albuquerque que é incrível, eu adoro a Sofi que é mais recente, eu adoro uma galera que está nesse meio. Essas pessoas que estão na internet e trazem proximidade, facilidade em acessar o conteúdo.
+BR: Tem algum recado que você queria deixar?
M.V.: Tipo uma frase bem motivacional? (risos) Hoje eu encontro no @desavexe muito do que sou e mais ainda do que fui um dia. Eu fico muito feliz que as pessoas consigam se encontrar no que eu escrevo. Verbalizar o que a gente sente é difícil. E ter alguém que faz isso com a gente é muito importante. E levar isso pra terapia, né? Gente, vamo pra terapia. É o melhor lugar pra conseguir entender seu corpo, seu movimento, pra onde a gente vai e principalmente o que a gente quer das trocas. E fico muito feliz que haja espaços como esse. espaço aberto para as pessoas me conhecerem para além do @desavexe. E me incentiva também nesse lugar da fala.
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